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Uma escala em Miami passada no Museu do Hambúrguer

Isto de fazer viagens não é fácil. Que o diga a minha cabeça, quando começou a pensar no que havia de fazer numa "escala" de quase oito horas em Miami.

entrada do Museu do Hambúrguer em Miami

Vamos por partes: para garantir o melhor preço até Nova Orleães, separámos a nossa viagem em duas partes. Primeiro, voámos de Lisboa a Miami e depois, independentemente, de Miami para Nova Orleães. Ora, isto significou que qualquer atraso no primeiro voo, ou na alfândega, ou na imigração, podia dar asneira - não tínhamos segurança nenhuma.

 

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Sem querer arriscar mais do que o necessário, decidimos que a melhor ideia era garantir que entre a chegada prevista a Miami e o voo para Nova Orleães passava... um montão de tempo, não há outra forma de o dizer. Iam ser sete horas e meia (mais uns pozinhos, porque o voo chega normalmente antes da hora marcada) para sair de um avião, passar por todos os controlos, fazer o que quiséssemos, voltar a passar na segurança e chegar a tempo para o embarque no segundo voo.

 

Isto tudo, claro, com uma viagem de oito horas, e cinco fusos horários de diferença, nas pernas. 

 

A primeira ideia era ir para o centro da cidade e ali passar umas duas ou três horas (dependia de quanto tempo demorássemos a chegar) a passear. Rapidamente foi descartada, porque tínhamos toda a nossa bagagem connosco - nós gostamos da coisa de não despachar malas, é verdade, e aproveitámos para fazer isso mesmo e pagar menos - e esperávamos muito calor. 

 

Logo depois, decidimos que íamos até ao Five Guys almoçar. Era um plano simples: ir até à zona de Wynwood, almoçar e voltar para trás. E estávamos (eu pelo menos estava) plenamente convictos que era o plano que íamos seguir. Só não contámos chegar a Miami sem fome e demasiado cansados para um viagem de autocarro que podia aproximar-se dos 50 minutos. Para cada lado.

 

Foi só no aeroporto que decidimos trocar os planos. Eu tinha lido, algures, um texto que falava sobre opções para escalas longas no aeroporto de Miami. Uma das sugestões parecia mesmo a nossa praia: um Museu do Hambúrguer, ali muito perto do aeroporto. Mencionei-o ao Rui e, pronto, estava decidido.

 

Malas às costas, bilhetes de autocarro comprados e, em menos de nada, estávamos no Magic City Casino, às voltas para encontrar o tal Museu. Não sabíamos o que esperar, e portanto também não sabíamos o que procurar. O que não faria mal se não estivéssemos a derreter no parque de estacionamento de um casino gigante. Valeu-nos, na verdade, o facto de ser tão grande que há um shuttle que anda às voltas a levar as pessoas dos carros até à porta do casino - deu-nos uma boleia até ao local onde demos com uma portinha, bastante disfarçada, de uma loja de gelados. Ao fundo, estava a entrada para o nosso museu.

O Wendy's é uma das cadeias representadas no museu

O Burger Beast Museum é do tamanho de uma grande sala, não mais do que isso. Alberga a coleção do "food blogger" Burger Beast, que se tornou obcecado com artefactos relacionados com hamburguerias e outras cadeias de fast food depois de ter recebido uma placa do extinto Burger Chef. Depois de anos a colecionar e manter as coisas em casa dos pais e no escritório, recebeu um convite para expor a coleção no Magic City Casino - e assim chegámos ao museu que temos hoje, e que juntamente com a Wall’s Old Fashioned Ice Cream Shop, contém mais de 3000 objetos.

 

Para nós, muitas cadeias e restaurantes mencionados no museu são desconhecidos. Sim, conhecemos o McDonalds, o Burger King e o Arby's, mas nunca ouvimos falar do Burger Castle, por exemplo, que até tem uma relação com o White Castle (e aí o Rui lembra-se do pior filme que viu na vida, que é precisamente sobre a aventura de dois amigos à procura de um hambúrguer de madrugada). O que não nos impede de ficar com muita vontade de conhecer todos aqueles sítios - e de comer àqueles preços, já que muitos dos artefactos mostram menus com décadas de vida.

Menu presente no museu

A entrada (10 dólares *mais* impostos, lembrem-se desse pormenor) vale os minutos passados lá dentro a descobrir as relíquias de um mundo que, apesar de familiar, está muito distante de nós. E a conversa com um dos amigos do dono, que está "a dar uma mãozinha", que nos fala do amigo português que tem uma empresa de turismo sustentável (chama-se João, mas experimentem lá perceber um americano a dizer esse nome) e nos diz quais os seus hambúrgueres preferidos. "Em termos de cadeias de fast food, acho que o meu preferido é mesmo o Wendy's. E aquela história de não congelarem a carne, que eu sempre achei que fosse marketing... é mesmo verdade e faz diferença."

 

Apropriadamente, há um do outro lado da estrada. E depois da fome crescente com que ficamos ao passear pelo museu, é mesmo lá que vamos parar. É que o hambúrguer é mesmo bom.

Dez dias no sul dos Estados Unidos como solução de recurso

Oak Alley Plantation

Em 2017 viajámos duas vezes até aos Estados Unidos: fizemos o California Zephyr – comboio que liga Chicago a Emeryville (San Francisco) – e ficámos apaixonados pela ideia de percorrer as linhas ferroviárias do país - e fomos ver um jogo da minha equipa da NFL (New England Patriots).

 

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Para 2018, tínhamos pensado fazer uma mistura das duas: ver um jogo da equipa da Sarah (Green Bay Packers, do Wisconsin) e voltar a atravessar o país a partir de Chicago, mas desta vez até ao sul, até Nova Orleães, com o City of New Orleans.

 

Tínhamos a viagem pensada, com direito a uma paragem em Memphis para visitar a varanda do hotel em que Martin Luther King foi assassinado, no cinquentenário da sua morte, orçamentos feitos e tudo definido com apenas uma coisa em suspenso: o calendário da temporada. Green Bay é uma cidade fria e não queríamos adiar muito a viagem. Nada correu bem: os Packers iam começar a época com dois jogos consecutivos em casa e o preço dos bilhetes representava um esforço que, para já, não valia a pena.

 

Fomos à procura de um plano B. Havia muitas opções à vista, com múltiplas combinações entre cidades, mas a escolha tornou-se cada vez mais clara: mantínhamos Nova Orleães e juntávamos Atlanta, ali «tão perto». Resistimos a abdicar de Memphis mas quando percebemos que a forma mais económica de fazer a viagem implicava chegar aos Estados Unidos via Miami, soubemos que teria de ficar para outra viagem.

 

O novo plano de viagem começou a desenhar-se sozinho. A primeira tentação foi ir ver preços, horários e duração das viagens dos autocarros da Megabus (que já nos foram tão úteis no passado), mas não havia ligações diretas a Miami e preferimos o avião a perder tempo desnecessário.

 

Feitas as contas, ia haver cinco voos: Lisboa-Miami, Miami-Nova Orleães, Nova Orleães-Atlanta, Atlanta-Miami e Miami-Lisboa. Na primeira passagem por Miami, tendo em conta as esperas sempre imprevisíveis para passar na segurança, optámos por uma escala mais prolongada que nos permitisse uma ida rápida à cidade durante a tarde.

 

Depois disso, eram quatro dias em Nova Orleãestrês em Atlanta e dois em Miami Beach, para descansar das próprias férias (temos sempre uma grande tendência para andar em vez de andar de transportes públicos e terminámos estes dias com mais de 90 quilómetros nas pernas) antes do regresso a Portugal.

 

Decidimos automaticamente que íamos mesmo ver um jogo da NFL, em Nova Orleães, e que íamos visitar o estádio mais recente da MLB, em Atlanta. Mantivemos em aberto a opção de ir ver um jogo de basebol também em Miami (a fraca qualidade das equipas não era um grande cartão visita) e começámos a definir prioridades em cada uma das cidades: visitar uma antiga plantação e o fantástico museu da II Guerra Mundial em Nova Orleães, a casa onde nasceu Martin Luther King Jr., o Olympic Park e um «circuito dos museus» (College Football Hall of Fame, World of Coca-Cola e o Center for Civil and Human Rights) em Atlanta.

 

O calor foi o único verdadeiro problema. Insuportável em Nova Orleães, sobretudo por causa da humidade, e difícil de aguentar em Atlanta, fez-nos pensar que talvez tivesse sido melhor adiar a viagem por mais um mês ou dois. Continuou a valer a pena mas tornou mais difícil visitar cada canto de cada cidade como mais gostamos: passo a passo. 

 

Voos (por pessoa)

Lisboa - Miami, ida e volta: 540 euros (TAP)

Miami - Nova Orleães: 77.66 euros (American Airlines)

Nova Orleães - Atlanta: 53.68 euros (Delta)

Atlanta - Miami: 91.05 euros (Delta)

 

Alojamento (por noite, para duas pessoas)

Nova Orleães: 95 euros

Atlanta: 93 euros

Miami Beach: 118 euros

O voleibol foi a surpresa inesperada de Bucareste

 

Visitar Bucareste em fevereiro é uma aventura que pode não estar ao alcance dos mais friorentos. Mas nós, que inaugurámos as viagens juntos com uma Paris coberta de neve e com temperaturas negativas em janeiro, estamos habituados.

 

Estamos mais velhos e, talvez, mais vulneráveis ao frio. A coragem pode já não ser a mesma e a fatura no final do dia pode ser maior, mas não vai ser isso a desmotivar-nos se a viagem certa pelo preço certo surgir no… momento certo.

 

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A primeira coisa que fiz quando decidimos marcar a viagem foi ir ver se alguma das equipas mais famosas de futebol em Bucareste jogava em casa. Com o Steaua e o Dínamo não tive sorte, mas o Rapid tinha um encontro marcado para o final da tarde. Mas o estádio era longe, não tinha sequer uma bancada coberta e, como já aprendemos no passado, é nestas situações que o frio mais se sente.

 Parlamento de Bucareste é um dos edifícios mais imponentes da Europa de leste

Tentei, sem muita pressão, convencer a Sarah mas percebi que era uma luta para a qual nem eu estava preparado. Pensei que iria ser uma viagem sem parte desportiva mas foi nessa altura, a jantar num hotel com vista para o imponente Parlamento, que fomos surpreendidos por uma equipa.

 

«Eles são mesmo muito altos. Têm corpo de jogadores de voleibol», disse a Sarah. Ali, enquanto comíamos, decidimos vestir a boina de Sherlock Holmes e perceber exatamente quem tínhamos à nossa volta. Confirmámos que eram jogadores de voleibol do Arcada Galati e, após uma teimosa pesquisa no telemóvel, chegámos à conclusão que iam jogar com o CSA Steaua Bucareste no dia a seguir… praticamente à mesma hora do jogo de futebol a que tinha pensado assistir.

CSA Steaua Bucareste vs. Arcada Galati

Descobrir exatamente onde era o jogo – o clube pertence ao Ministério da Defesa da Roménia e tem instalações espalhadas pela cidade – foi, ainda assim, o maior obstáculo mas, chegada a hora do jogo, lá estávamos nós.

 

Sem precisar de pagar bilhetes, apesar de um bem-disposto dirigente nos ter dito que precisávamos de desembolsar 50 euros para ir à casa de banho, assistimos ao duelo que tinha a liderança do campeonato em disputa. Silenciosamente, torcemos pelos nossos vizinhos de hotel e pelo brasileiro que tinham no plantel – apesar de durante muito tempo pensarmos que era outro jogador.

 

Perderam. E eles, tal como nós, tiveram de atravessar a noite de Bucareste para regressar ao hotel. Chegámos ao mesmo tempo mas houve uma diferença. Enquanto eles tiveram tempo para tomar um banho quente no balneário e regressar num transporte reservado, nós andámos mais de um quilómetro até à paragem de um autocarro público.

 

Do voleibol para a elite romena do desporto

 

O jogo entre o Steaua e o Arcada Galati não foi a única parte desportiva do fim-de-semana prolongado. Durante as nossas pesquisas, tínhamos percebido que havia um Museu Desportivo do Comité Olímpico da Roménia junto ao «Arco do Triunfo» de Bucareste. Fomos obrigados a fazer duas viagens – estava fechado no primeiro dia – mas valeu a pena.

Edifício moderno, feitos antigos

Afinal, o país tem uma grande tradição em Jogos Olímpicos e foi responsável por alguns dos melhores momentos da história. Como não podia deixar de ser, há uma pequena estátua de Nadia Comaneci, em homenagem à atuação perfeita em Montreal, nos Jogos de 1976.

 

O edifício é moderno e tem dois pisos, mas parece ligeiramente abandonado. Uma empregada garante a segurança das salas e explica-nos mais ou menos o que temos para ver. É um museu desportivo igual aos outros. Tem os melhores atletas, desde os pioneiros aos mais recentes, e conta-nos uma história com pormenores que desconhecíamos.

 

Há partes de equipamento que pertenciam às grandes figuras do desporto romeno e sentimo-nos assoberbados pela história. Para quem estava tão habituado a programar a componente desportiva de cada viagem ao pormenor, soube bem ser surpreendido e acabar a ver coisas que não nos tinham passado pela cabeça. Porque viajar também é isso: dar margem para nos deixarmos surpreender pelo inesperado.

 

PS: Por falar em surpresa, teve muita piada quando, oito meses depois, fomos ver o Sporting-Benfica em voleibol e estavam dois ex-jogadores do Arcada Galati em campo. Estava destinado.

 

 

 

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Abraçar a adversidade e ir à descoberta em Lyon

 

As viagens são capazes de nos marcar pelas mais variadas razões. Podem não passar de pormenores avulso, sem grande impacto no balanço final, mas nem por isso deixam de se tornar num sinónimo automático sempre que nos lembramos de um destino.

 

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Estátua de Luís XIV junto à Grande Roda

O dia em Lyon será lembrado para sempre como aquele em que decidimos que nunca daremos o nome de Dinis a um filho, nosso ou de outra pessoa qualquer. Sim, é nome de rei, O Lavrador, mas também o da criança que semeou o pânico durante duas horas dentro de um avião… mesmo atrás de nós, fazendo das nossas cadeiras um saco de pancada.

 

O objetivo era ir para Genebra mas o aeroporto fechou quando já estávamos a fazer a aproximação à pista e, depois de várias voltas no ar, acabámos desviados para Lyon. Foi a primeira vez em mais de 100 voos que nos aconteceu algo do género: já tínhamos brincado com a sorte com nevões, atrasos e avarias mecânicas, mas o destino, a ir ou a voltar, nunca tinha sido posto em causa. Desta vez foi impossível escapar.

 

A companhia aérea começou por prometer autocarros que fizessem a ligação até Genebra mas com o piorar das condições climatéricas até as estradas foram cortadas. A alternativa única passava a ser o comboio, com pelo menos sete voos nas mesmas condições que nós e a prometer o caos nas próximas horas.

 

As filas para comprar os bilhetes para o centro de Lyon, de onde depois sairíamos para Genebra, eram intermináveis. Fizemos o que fazemos tantas outras vezes: dividimos para reinar. Um numa, outro noutra (nas duas que nos pareceram mais pequenas entre cinco ou seis) e esperámos. De repente, enquanto falávamos ao telefone sobre os horários dos comboios, surgiu a proposta: «E se ficarmos cá até ao final da tarde e aproveitarmos para ver um pouco da cidade?».

Rio Ródano

Foi uma sugestão tão simples que nenhum de nós sequer chegou a pensar que poderia haver lados negativos. Desse por onde desse, íamos chegar a meio da tarde a Genebra, com o dia perdido, e já depois da hora marcada para a nossa visita ao CERN. Por outro lado, ao ficar em Lyon, íamos conseguir escapar ao caos de centenas de passageiros e seguir viagem com mais calma.

 

Nunca é bom ter um voo desviado. É uma situação que pode provocar stress e discussão, pode causar desentendimentos evitáveis mas ali, na fila para o comboio, percebemos que abraçar a adversidade e ir à descoberta de Lyon era a melhor solução que tínhamos. E a única boa também.

 

Maximizar o tempo disponível

 

Acordámos a pensar que íamos passar o dia em Genebra e de repente tínhamos pouco mais de quatro horas em Lyon. Todos os minutos eram valiosos e queimámos etapas: enquanto esperávamos pelo expresso para o centro da cidade, dividimos tarefas - a Sarah comparava os bilhetes do TER para Genebra através do telemóvel (evitávamos filas desnecessárias na estação e garantíamos os lugares), eu procurava pelo que pudéssemos visitar em Lyon «a correr».

 

Somos sempre mais adeptos de calcorrear as cidades, respirar o ambiente, observar as pessoas e a arquitetura, por isso não deveria ser muito complicado. Mas por vezes abrimos exceções e Lyon gritava por uma: o Centro de História da Resistência e da Deportação.

Céus franceses

Depois, sim, íamos procurar tirar o pulso à cidade e seguir rumo ao coração histórico e à sua arquitetura mais antiga. Num cenário perfeito, teríamos ido à Basílica de Notre Dame no topo da colina, com vista privilegiada para a cidade, mas a inclinação e a falta de tempo foram fortes senãos.

 

Afinal, tínhamos acordado às três da manhã – sem banho tomado porque as obras municipais acharam que seria uma boa hora para afetar o serviço de água -, estávamos cansados e os contras pareciam ser maiores do que os prós. Mas nem por isso deixámos de ficar fascinados com a parte velha de uma cidade que conjuga bem o passado com o presente e explora a gastronomia local a ponto de nos «obrigar» a experimentar o praliné rosa [desilusão!] numa das esquinas das ruelas da parte velha.

Uma experiência para não repetir

Quando demos por nós era altura de voltar. Foi pouco tempo, é certo, e havia mais a fazer, mas valeu a pena. Maximizámos a tarde da melhor forma possível e até aproveitámos um tempo muito mais convidativo do que aquele que estava à nossa espera em Genebra.

 

 

 

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Ir a Cardiff ver os gigantes do râguebi

 

«Um dia vou ver um jogo de Gales ao Millennium.»

 

Quando escrevi esta publicação no Facebook a 1 de outubro de 2012, estava longe de saber o que o futuro me tinha reservado. Sim, já conhecia o Rui mas nunca tínhamos viajado juntos. A estreia com Paris, em janeiro de 2013, ainda não fazia parte dos planos e nenhum de nós sabia que nos íamos tornar obcecados não só com viagens mas também com desporto em viagens.

 

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Tudo isto torna ainda mais curioso que a 1 de outubro de 2015, exatamente três anos depois, o sonho que tinha revelado com uma frase simples se concretizasse: ver a seleção galesa de râguebi a jogar em casa, a mais emblemática, em Cardiff.

O famoso "chapéu" galês...

Podia dizer que foram só facilidades: metemo-nos num avião até Londres, apanhámos o autocarro e comprámos bilhetes para um jogo de Gales. Mas a verdade é que não foi nada assim. A história começou no início de 2014, quando decidimos que gostávamos de assistir a alguns jogos do Mundial que se disputava no ano seguinte no Reino Unido.

 

E se o primeiro passo estava dado e a decisão tomada, vinha agora tudo o resto: olhar para o calendário, perceber a que jogos queríamos e podíamos assistir, como chegaríamos lá, como seria com as férias necessárias...? Eu, claro, queria ver Gales. No Millennium, se fosse possível. E também ficaria muito contente se visse os All Blacks, se não fosse pedir muito.

 

Como os deuses do planeamento gostam de nós, prepararam dois jogos a 1 e 2 de outubro em Cardiff: Gales-Fiji e Nova Zelândia-Geórgia. Estava decidido, agora restava esperar... pelo sorteio para a compra de bilhetes, em setembro de 2014 (sim, sim, mais de um ano antes), e ver se conseguíamos ter a estrelinha da sorte do nosso lado.

 

Em setembro fizemos a candidatura para os dois jogos na categoria D (a mais barata) e um mês depois recebemos os resultados: não tínhamos bilhetes para o jogo de Gales. Sim, íamos a Cardiff, e sim, íamos ver os melhores do mundo, mas o meu sonho não se ia cumprir.

Râguebi invadiu as muralhas de Cardiff

Claro que, porque são atentos, percebem que a coisa não acabou aqui. Um mês depois abriu a venda geral ao público - posso escrever um post inteiro sobre o processo de venda dos bilhetes para o Mundial de râguebi, que repetimos para o Japão, mas não é o momento - e havia bilhetes para o Gales-Fiji. Na categoria C, bastante mais cara que a nossa escolha de "vamos gastar o mínimo possível". Mas havia. E nós já íamos estar lá no dia 2... E quantas oportunidades havemos de ter para ver Gales no Millennium? Pronto, seja. Comprámos os bilhetes. A 26 de novembro de 2014 ficou confirmado que dez meses e uns dias depois, estaríamos em Cardiff.

 

Entrámos numa nova fase: a viagem propriamente dita. Como chegar a Cardiff? Onde ficar? Claro que, nas três ou quatro semanas em que dura um mundial, as cidades que o recebem estão viradas do avesso. A antecedência era fundamental. Depois de ver as alternativas, optámos por voar para Londres e apanhar um autocarro até Cardiff. Lá, ficaríamos uma noite - de 30 de setembro para 1 de outubro - e, depois do jogo de Gales, seguiríamos para Swansea para a seguinte (porquê? Porque conseguimos reservar um quarto por 39 libras para a primeira noite, mas os preços mais baratos para o dia 1 começavam nas 300 libras). A terceira noite ia ser passada entre um átrio de hotel onde conseguíssemos beber um chá e o autocarro de volta para Londres, que partia às 4 da manhã.

 

Tínhamos tudo pronto, só restava esperar pelo dia da partida. Ia tudo correr bem - e correu mesmo (ou teria corrido se não tivesse havido um carro a incendiar-se numa autoestrada qualquer no meio de Inglaterra que transformou uma viagem de três horas e meia numa tortura de sete horas. Sem comida).

 

Cardiff não desiludiu. Há qualquer coisa de especial numa cidade que recebe uma grande competição desportiva: já o tinha notado em Berlim, em 2006, mas essa era uma enorme capital europeia. Cardiff é uma cidade que se percorre em duas horas de uma ponta a outra. Tudo cheirava a râguebi; dizer que o ambiente era festivo é o understatement do ano.

 

Aos apoiantes das equipas que jogavam naqueles dias juntaram-se milhares de pessoas que conseguiram bilhetes para um daqueles jogos e faziam longas viagens para chegar ao Millennium. John foi um deles: assistiu ao nosso lado ao encontro entre Gales e Fiji e, quando percebeu que éramos turistas, não conseguiu evitar meter conversa. «Estão a torcer por Gales porquê?» foi a pergunta feita de chapa. Lá expliquei o meu amor aos galeses, e aproveitámos o intervalo para saber um pouco mais sobre o inglês que estava ali - como tantos outros - a apoiar as Fiji. Tinha chegado a Cardiff de táxi, durante a tarde, vindo de Londres, e partiria logo depois do jogo. Porquê? «Consegui bilhete e, no final de contas, compensa mais ir e vir de táxi do que estar a pagar balúrdios para apanhar o comboio em horários pouco amigáveis. Hoje foi dia de trabalho.»

Adeptos de Fiji entre galeses

Para os que, vindos de fora, ficaram por aqueles dias na zona, Swansea foi uma escolha popular: não fomos os únicos a esperar na fila para chegar de comboio até à cidade vizinha e andar uns largos minutos da estação até aos hotéis do centro. E se Swansea não é o meu destino favorito, não posso dizer que a viagem de regresso a Cardiff no dia seguinte, em plena luz do dia, não tenha sido um regalo para os olhos.

 

Estar num Mundial (de qualquer modalidade, provavelmente) é uma experiência única. Para mim, foi além de tudo o resto um sonho tornado realidade: tinha visto Gales a jogar no Millennium. Mas agora não podia parar: próxima paragem, Japão-2019.

 

Voo (ida e volta, por pessoa): 75 euros (para Londres, Ryanair)

Autocarro (ida e volta, por pessoa): 12 euros (Londres-Cardiff, Megabus)

Alojamento (por noite, para duas pessoas): Cardiff, 46 euros / Swansea, 65 euros

 

 

 

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Um desafio olímpico em Estocolmo

Estádio Olímpico de Estocolmo

O caminho para o Estádio Olímpico de Estocolmo começou a desenhar-se na véspera, em Helsínquia. A TAP tinha feito asneira nos horários dos voos e tinha-nos antecipado o voo de regresso da Suécia para uma hora em que não conseguiríamos chegar depois de fazer o cruzeiro de regresso da Finlândia.

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Depois de uma troca de mensagens no Twitter, a solução passou por encontrar uma escala em Frankfurt que, entre outras coisas, nos permitiria passar mais umas horas em Estocolmo no dia seguinte. Visitar o estádio que acolheu os Jogos de 1912 não estava entre as nossas prioridades mas o tempo extra fez com que a oportunidade fosse criada. E ainda bem.

Nunca pensámos nisso como um verdadeiro objetivo mas começámos a perceber que ao longo das nossas viagens tem havido espaço para visitas a estádios olímpicos. O de Berlim foi mesmo um dos pontos mais interessantes da viagem, mas também já passámos pelo de Los Angeles, pelo de Pequim e pelo de Barcelona. Neste fim-de-semana específico, a ideia até passava por visitar o de Helsínquia mas estava tudo em obras e não conseguimos mais do que ver as estátuas de Paavo Nurmi e Lasse Viren do lado de fora.

Estátua de Lasse Viren em Helsínquia

O de Estocolmo é diferente de todos os que tínhamos visto até então. Desde logo por ter mais de 100 anos mas também por ter mantido muito da sua essência da altura. As bancadas são ricas em madeira, o estádio tem uma capacidade muito limitada e a própria forma como os lugares estão dispostos aponta para uma maneira diferente de assistir às emoções.

No meio de um quarteirão, também com obras à mistura, encontrar uma forma para entrar foi o mais complicado. Não é uma visita turística, não tem lojas, não tem visitas guiadas e todos os portões que fomos encontrando estavam fechados. Num dos lados, conseguíamos ver a relva e a pista de atletismo mas esbarrávamos nos portões giratórios que só rodavam para permitir a saída. Nada de entrada.

Lá dentro, vários serventes movimentavam-se com relativa descontração, ignorando que procurávamos uma forma de entrar. Fizemos uma pseudo volta olímpica. Procurámos por entrada a meio, fomos tudo até à esquerda e depois recuámos até ao início para tentar melhor sorte do lado direito. Ao fundo, percebemos que havia quem estivesse a entrar. Era a nossa oportunidade.

Sentimos que não devíamos estar ali. Quem tínhamos visto parecia estar pronto para ir correr e nós tresandávamos a turistas. Fizemos um pacto: vamos ser descontraídos, continuar a andar, não parecer perdidos, ir à confiança e fazer transparecer que sabemos perfeitamente o que estamos a fazer. Et voilà, uns minutos depois estávamos no meio das bancadas, enquanto vinte a trinta atletas ouviam as recomendações de um responsável antes de começar uma sessão de treino.

Viagem pelo passado

As bancadas do Estádio Olímpico de Estocolmo

A estrutura impressiona por parecer tão antiga como na verdade é. Há suportes de madeira por todo o lado e estão perfeitamente integrados naquele ambiente, com uma pista de atletismo a brilhar e um relvado bem tratado. Conseguimos perceber onde é a tribuna de imprensa e por toda a bancada há a repetição dos mesmos brasões: uns apontam claramente para a coroa sueca, os outros deixaram-nos na dúvida.

Brasões suecos

Andamos pela bancada – para longe do grupo de atletas – e antecipamos a saída pela porta da maratona. Pisamos a pista de atletismo e, naquele momento, ao olhar para a fasquia do salto em altura, sinto uma vontade incontrolável de voltar a tentar.

No secundário, tinha passado horas a bater pequenos recordes pessoais e ali, naquele momento, a fasquia parecia estar a uma altura perfeitamente ultrapassável. Mas não saltava há mais de 15 anos, não estava com o calçado adequado e… provavelmente nem devia estar ali. Saltar para derrubar seria um risco e uma vergonha demasiado grande.

Estádio Olímpico de Estocolmo

 A surpresa chegou no momento da saída. Estou farto de ouvir falar da história de Francisco Lázaro, o corredor português da maratona que morreu durante a prova, precisamente em Estocolmo, depois de ter barrado o corpo com graxa.

O momento está marcado na história mas nunca pensei que pudesse haver uma placa olímpica de homenagem, com versão sueca de um lado e portuguesa de outro. Ficamos a saber que mais de 20 000 participantes se juntaram após a morte numa sessão comemorativa no estádio num programa que «incluía a prática de modalidades desportivas, canções e música» e onde «foi lançada uma grande queima de fogo-de-artifício, que terminou com um grande “L” de Lázaro em letra de fogo nos céus da noite».

A placa conta também que a sessão angariou 14 mil coroas, «uma grande soma» para 1912 (1362 euros), numa verba que foi dada «a sua jovem esposa e o seu filho, nascido após a partida de Lázaro para os Jogos de Estocolmo».

Francisco Lázaro foi a primeira vítima mortal dos Jogos Olímpicos modernos.

Placa em memória de Francisco Lázaro

 

 

 

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O Minho como aperitivo para Vigo

Dois intrusos numa das vistas mais icónicas de Ponte de Lima

Há uma coisa sobre a qual não falamos (todos) o suficiente. Viajar é contagiante. Há um bicho-viajante que se instala dentro de nós quando começamos a fazer viagens com maior frequência e, quando paramos para pensar, percebemos que não há como nos livrarmos disto.

 

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A nossa viagem a Vigo começou quando estávamos a voltar para Lisboa depois de termos feito a Estrada Nacional 2 entre Montargil e Chaves. Ao parar numa estação de serviço na autoestrada, enquanto a Sarah foi comprar qualquer coisa, fui ao telemóvel ver quando é que o Atlético Madrid jogava em duas cidades: Vigo e Sevilha.

 

A minha paixão pelo Atlético Madrid tem-nos feito fazer várias viagens até à capital espanhola para ver jogos. Agora, depois da ida a Chaves, pensei que poderíamos aproveitar uma viagem diferente que nos permitisse ver um pouco mais de Portugal e, ao mesmo tempo, um jogo do Atlético.

 

Quartel-general em Ponte de Lima

Ponte de Lima

Sem feriados perto do fim-de-semana ou dias de férias para meter, a viagem teria de começar na sexta-feira a seguir ao trabalho. O grande objetivo era poder chegar o mais perto de Vigo possível para que o dia no sábado fosse menos cansativo.

 

Começámos a procurar por hotéis a partir do Porto e a calcular quantas horas precisaríamos para chegar lá. Queríamos encontrar algo barato, confortável e, acima de tudo, que nos permitisse fazer um check-in tardio. A escolha recaiu num hotel nos arredores de Ponte de Lima, cumprindo na perfeição a ideia que tínhamos para poder explorar um pouco do Minho no sábado.

 

O jogo começou por estar marcado para as 16h15 (hora espanhola) mas a previsão de calor adiou-o para as 18h30. Foi uma alteração perfeita: teríamos tempo para ir com mais calma no sábado até Vigo, sem esquecer alguns dos sítios que queríamos visitar no Minho.

 

Ponte de Lima, claro, foi a primeira paragem. Estacionámos perto da ponte, à sombra de uma árvore que parece ter sido plantada especificamente para nos satisfazer numa manhã de imenso calor, e fomos explorar a zona.

Ponte de Lima

Tirámos umas primeiras fotografias perto do carro e decidimos atravessar a ponte a pé, depois de comprarmos uma garrafa de água de litro e meio que nos permitisse refrescar sempre que precisássemos. A «vila mais antiga» de Portugal respira vivacidade e a prova de canoagem infantil que estava a acontecer é apenas mais um sinal disso. 

Rio Lima

Ponte de Lima tem uma enorme tradição na canoagem

Parámos para ver uns minutos de rapazes e raparigas a pagaiar à melhor velocidade que conseguiam perante os gritos de motivação de amigos, familiares e monitores. Ali, na capital da modalidade, poderão estar os próximos Fernandos Pimentas e Emanueis Silvas.

 

Próxima paragem: Viana do Castelo

 

Estava na hora de regressar ao carro e fazermo-nos à estrada. O objetivo era seguir até ao litoral até chegar a Viana do Castelo. Tínhamos uma coisa em mente: o Santuário de Santa Luzia. O calor tornava tudo cada vez mais complicado mas seguimos a missão à risca.

 

Não havia muita gente no Santuário mas à porta estava estacionada uma enorme limusina reservada para os noivos que casavam lá dentro. Não entrámos – não quisemos incomodar – mas aproveitámos para fotografar o Santuário e absorver as vistas sobre Viana do Castelo que o miradouro nos oferecia. Tinha sido uma boa ideia ir até lá.

Santuário de Santa Luzia

Santuário de Santa Luzia

Vista sobre Viana do Castelo

A hora de almoço estava quase a chegar e ainda não sabíamos exatamente onde comeríamos. A ideia era seguir pelo litoral para norte, por Vila Praia de Âncora, Caminha e Vila Nova de Cerveira até cruzar o rio Minho para chegar a Espanha.

 

O acaso trocou-nos (um pouco) os planos. À saída de Viana do Castelo, um casal pedia boleia aos carros que passavam. À primeira ignorámos mas depois de falarmos entre nós, decidimos fazer inversão de marcha e perguntar para onde queriam ir. «Âncora», disseram. «Pois bem, entrem».

 

Ela era espanhola e jornalista, ele francês e estudante de Ciência Política com uma ideia de futuro muito indefinida ainda. Vivem os dois em Toulouse e tinham chegado ao Porto, dois dias antes, via Marselha. Estavam a caminho de Vigo para ir ter com uma amiga que trabalha nas Islas Cíes.

  

Almoço em Vila Nova de Cerveira

 

A conversa era tímida e intercalada por momentos de silêncio. Envergonhados, acabaram por pedir para continuarem connosco mais uns quilómetros. Em Caminha, chegámos a parar para apanharem o barco mas faltavam duas horas e meia para a próxima travessia e, uma vez mais, pediram-nos para seguir connosco.

 

Despedimo-nos em Vila Nova de Cerveira. Eles iam passar a ponte e nós fomos à procura de um sítio para comer. Estacionámos no centro e atravessámos pequenas ruas, saltitando entre sombras. Tudo estava ornamentado com peças de crochet mas nada se aproximava sequer da casa que vimos, à nossa esquerda. Toda ela parecia ser feita de lã, desde os tijolos à roupa estendida entre varandas. 

Uma casa peculiar em Vila Nova de Cerveira

Não foi surpresa, por isso, que os poucos turistas que passavam fizessem fila para ter a oportunidade de tirar fotografias.

 

A caminho de Vigo

 

Depois de uma refeição confortável – e refrescante – concordámos em seguir diretos para Vigo, chegando a tempo de um possível mergulho na praia antes do jogo. Era sábado, o termómetro marcava 38 graus, e devia estar tudo a abarrotar mas, tal como tínhamos feito na viagem até Chaves, só precisávamos de cinco minutos para trocar de roupa, sair do carro, ir à água, mergulhar e voltar.

 

O desafio foi mais complicado do que esperávamos. Como nós, havia dezenas de carros à procura de um lugar para estacionar. Desistimos da ideia e optámos por uma solução intermédia: eu ia ficar no carro, no parque de estacionamento de uma equipa do terceiro escalão espanhol (FC Coruxo), enquanto a Sarah ia à água. Depois, trocávamos de posição. Depois de parar o carro, fomos recompensados. Um casal ia sair e íamos ficar com um lugar praticamente à entrada da praia. Perfeito!

 

Praia do Vao

A água não estava propriamente quente mas o calor que sentíamos ao sair recompensava. Não precisámos de mais de vinte minutos para voltar a sair, com o corpo refrescado e a mente já no jogo de futebol.

 

O maior desafio voltou a ser o mesmo: estacionar. Ficámos a mais de um quilómetro do Estádio de Balaídos mas, vendo as coisas pelo lado positivo, o caminho era sempre a descer. Sim, se forem pessimistas poderão destacar que o regresso ao caso seria sempre a subir. Vá, esqueçamos essa parte por agora. 

Celta-Atlético nos Balaídos

O ambiente no estádio foi interessante. Felizmente ficámos em lugares que tinham sombra e por isso não sofremos tanto como quem estava no outro topo. O Celta venceu o Atlético Madrid por 2-0 (é uma espécie de maldição que tenho: em onze jogos que vi, os colchoneros só ganharam três e pelo meio estive num empate que poderia dar título em 2014 e na final da Liga dos Campeões em Lisboa) e nunca pareceu ter o triunfo em causa.

 

Regresso a Portugal com o plano de domingo na mente

 

Confesso: o caminho de regresso ao carro nem foi muito difícil. Ainda não tínhamos hotel reservado para a noite de sábado mas a ideia era ficar perto do Porto para que o regresso a Lisboa no dia seguinte não fosse muito cansativo.

 

A sair de Vigo, tivemos a oportunidade de ver, possivelmente, o pôr-do-sol mais bonito que alguma vez vimos (uma pena a autoestrada não ter dado para tirar uma única fotografia de jeito) e seguimos o nosso caminho, já com um hotel reservado em Gaia.

 

O domingo não era apenas o dia de regresso a Lisboa. Tínhamos decidido ir a Aveiro. A Sarah nunca tinha ido e eu só tinha ido em trabalho – duas vezes diferentes, sempre para entrevistar jogadores do Beira-Mar. Agora, íamos estar só os dois e com tempo para fazer o que quiséssemos. Passeámos pela ria, atravessámos a Ponte Laços de Amizade, almoçámos enquanto vimos a largada do Grande Prémio de Fórmula 1 no telemóvel, comprámos ovos moles e fomos de carro até à Costa Nova, para ver as tão famosas casas com riscas coloridas. 

Ponte Laços de Amizade em Aveiro

Aveiro

Famosas casas na Costa Nova

Por esta altura, o cansaço já nos invadia o corpo. Não é fácil andar tanto com tanto calor durante tanto tempo. Assim, a meio da tarde, decidimos regressar a Lisboa. Com o sentimento de dever cumprido e… já com outras viagens em mente. É contagiante!

 

 

 

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Top-5 da Estrada Nacional 2 (Montargil-Chaves)

 

Em agosto passámos quatro dias a fazer a Estrada Nacional 2 entre Montargil e Chaves para ir ver um jogo de futebol. Pelo caminho, parámos várias vezes e reunimos dicas sobre algumas das melhores coisas que se podem fazer ao longo deste troço.

 

(Also available in English)

 

1. Centro Geodésico de Vila de Rei

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Pode ser um prazer inútil mas há qualquer coisa de mágico ao parar literalmente ao centro de Portugal quando se está a fazer uma estrada que liga Faro a Chaves. Se o tempo estiver agradável, a vista é magnífica e oferece-nos uma perceção apurada da geografia portuguesa… em todas as direções.

 

2. Praia fluvial da Folgosa

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Dependerá sempre do mês e do calor que se estiver a fazer a sentir, mas de entre os vários mergulhos que fomos dando, nenhum nos pareceu melhor do que o da Folgosa. Sim, a água das barragens de Montargil e de Sordo pode ter estado quente e a vista da praia fluvial do Penedo Furado ser mágica, mas se juntarmos a facilidade de acesso, o espaço para estacionar, a beleza natural e a temperatura da água, a nossa sugestão final vai mesmo para a Folgosa. 

 

3. Ponte Filipina

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Temos sentimentos contraditórios em relação à Ponte Filipina. Acreditem: vindo de alguém que conduziu até lá abaixo de um lado e subiu até à Estrada Nacional do outro, pode ser uma experiência traumatizante… nos dias seguintes. Mas agora, pensando bem, compensou e só temos pena de não termos parado também no miradouro. Ah, se não quiserem arriscar, talvez seja melhor deixar o carro numa zona segura e fazer o resto do caminho a pé. Pode custar a subir mas pelo menos não passam por sustos e estão mais à vontade para aproveitar a beleza do que a natureza tem para oferecer.

 

4. Miradouro do Castro

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Exige um pequeno desvio – fica a 13 quilómetros da Estrada Nacional 2 (Vila de Rei) e fomos lá parar depois de passar a noite em Ferreira do Zêzere. A vista do Miradouro do Castro é uma das melhores que conseguimos ver durante os dias de viagem: entre os vales e uma casa num planalto, também há espaço para o Zêzere serpentear ao fundo. Vale bastante a pena.

 

5. Pena – uma aldeia de xisto

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A experiência com a Ponte Filipina marcou-nos um pouco e quisemos evitar grandes aventuras com o carro à procura das Aldeias do Xisto. Depois de uma pesquisa, percebemos que a aldeia de Pena é uma das que fica mais próximas da Estrada Nacional 2 e a recompensa é justa. A conduzir, o único perigo são mesmo os carros que aparecem em sentido contrário a julgar que a estrada tem um só dono.

 

 

 

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Fazer meio Portugal pela nossa "route 66"

 

Agosto, quatro dias e um destino traçado: Chaves, no sábado às 16.30h, para assistir ao encontro entre a equipa da terra e o Portimonense.

Linha de comboio em Vale de Cortiças, à entrada de Abrantes

Estes eram os ingredientes que, no dia antes da partida, tínhamos para decidir o que fazer. A ideia original era relativamente simples: fazer Lisboa-Braga e passear pelo Minho, com paragem por Guimarães, antes de seguir para Chaves. Nada contra, claro. Mas e se aproveitássemos para ver mais, ou diferente?

 

(Also available in English)

 

Não faço ideia como fui dar com um artigo sobre a Estrada Nacional 2, que atravessa o país de norte (Chaves) a sul (Faro), mas pareceu-me um bom ponto de partida para a viagem. Nós gostamos muito de atravessar países, como já se viu no California Zephyr. O grande final Chaves-Portimonense fazia com que tudo parecesse escrito nas estrelas.

 

A ideia de descer de Lisboa até ao Algarve e fazer a N2 completa para norte atravessou-se no nosso espírito, mas rapidamente nos lembrámos que a segunda-feira seguinte era de trabalho. Onde começar então a nossa viagem?

 

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O primeiro mergulho

 

Mora, Montemor ou Montargil eram as opções mais óbvias. Tendo chegado de Évora na manhã da partida para a nossa viagem, não estava desejosa de me sentir a voltar para trás - Montemor ficou fora. A diferença entre Mora e Montargil é mínima, pelo que decidimos seguir diretamente para a barragem e começar aí, em Montargil, a aventura.

 

Ainda antes do almoço estávamos de malas feitas e garrafas de água compradas para seguir viagem. Só sabíamos que três dias e meio depois tínhamos de estar em Chaves a tempo do jogo. O que faríamos até lá era para ser decidido na altura.

Barragem de Montargil

Com a N2 à vista, chegou também o espelho de água da barragem, apetitoso com o calor que se fazia sentir. Não era tarde nem cedo para dar início ao processo que se tornou uma mini-tradição destes dias: chegar ao pé de uma barragem ou praia fluvial, estacionar o carro, vestir o fato de banho e mergulhar de cabeça nas águas muito menos frias do que esperávamos.

 

A albufeira criada pela barragem de Montargil é enorme e tem vários pontos de acesso à água. Nós ficámos logo à chegada, meio intrusos no meio de duas famílias acampadas nas margens, a pescar as próximas refeições. A água estava quente e ainda deu para um par de mergulhos antes de decidirmos que era boa hora para nos fazermos à estrada. Era o início da aventura pela nacional até lá acima.

 

Paragem no castelo

Castelo de Abrantes

O caminho até Abrantes não teve grande história, mesmo com o encanto de passarmos ao lado do aeródromo de Ponte de Sôr. A placa de Domingão City, memória de outras aventuras, já tinha passado a Domingão. E aquela hora de carro fez-se bem, até a fome apertar.

 

Chegados a Abrantes, já mais hora de lanche que de almoço, decidimos parar no Castelo para a verdadeira photo op e alimentar o corpo antes disso. Não ficou por notar que, ao entrarmos n'O Alcaide, do outro lado da rua, o dono teve o cuidado de mudar a televisão da tourada para um canal de música.

 

Alimentados de estômago e olhos, seguimos viagem em direção a Vila de Rei - o único ponto de paragem definido ainda antes de sairmos de Lisboa. Mas ainda antes de chegarmos, uma placa a indicar a praia fluvial do Penedo Furado levou-nos a mais um desvio, e a mais um mergulho.

Praia fluvial do Penedo Furado

Agora, depois de lá estarmos, já sabemos que é uma praia fluvial conhecida e reconhecida pela beleza natural. Talvez por isso tenha sido a única em que nos sentimos com demasiadas pessoas. A estrada para lá chegar é sinuosa, e estava repleta de carros estacionados ainda longe da água. Como a sorte protege os audazes, descemos com toda a confiança e conseguimos chegar bem perto da praia. Nova muda de roupa, mergulho naquela água límpida onde não faltavam peixes e podíamos seguir viagens, mais frescos.

 

O centro de Portugal vinha a seguir, de forma bastante literal. "Estar no centro geodésico é um prazer tão inútil. Mesmo fixe", foi o que nos disseram, e na verdade é uma boa descrição da nossa paragem. Só quisemos dizer que tínhamos estado ali, no verdadeiro centro de Portugal, e ver a vista lá do alto. Daí que fosse a única estrelinha marcada no nosso mapa antes da viagem.

Centro geodésico de Portugal em Vila de Rei

Fomos brindados com um local quase deserto (com wifi gratuito!) e um barulho inacreditável de rajadas de vento que não sentimos. Zero de arrependimentos.

 

Com o final da tarde a aproximar-se a passos largos, era chegada a hora de decidir onde ficar a dormir. E, deixem-me que vos diga, não é tarefa fácil arranjar dormidas fora dos grandes centros turísticos, em pleno agosto. A solução? Atravessar o rio e pernoitar em Ferreira do Zêzere. O único problema foi passar pela pior ponte que já atravessei na vida (a culpa é das vertigens...). 

 

Dica importante? Não assumam que vai ser fácil jantar num dia de feriado em agosto.

 

A ponte que não vale o desvio

 

O dia 2 da nossa viagem começou com nova passagem pela terrível ponte, de regresso à N2. Estávamos em plena área ardida no ano anterior, e não há como evitar olhar para os quilómetros de troncos queimados e sentir um arrepio na espinha. A cada nova curva ou estreitamento de estrada avaliamos como sairíamos dali se um incêndio estivesse à nossa volta.

 

Para esquecer incêndios, decidimos então seguir para novo mergulho. Antes, no entanto, a indicação de uma "ponte filipina" chamou-nos a atenção. Iríamos então à descoberta... e ao arrependimento.

Ponte Filipina em Pedrógão

Construída durante a dinastia filipina (que choque!), a ponte é bonita, ligando as duas margens do Zêzere muito perto do rio, mas o caminho até lá - e para sair de lá... não é o melhor, digamos assim. Estranhámos quando vimos um carro estacionado no início da descida, quando o mapa indicava que ainda estávamos a um quilómetro da ponte. Mas decidimos continuar caminho.

 

Depois já era tarde de mais para voltar para trás: a estrada é estreita, sempre a descer em inclinações perigosas, está em más condições e é escorregadia mesmo no verão. "Como voltar para trás quando chegarmos lá abaixo?" era o pensamento que teimava em não nos deixar. Felizmente, o mapa mostrava que as curvas eram em menor número do lado de lá do rio.

 

Depois de uma breve paragem para fotografias, o caminho tinha de ser feito. E, tirando um momento de pânico em que as rodas do carro (citadino) ficaram presas num buraco e teimavam em não andar, tudo se fez. Chegámos de novo à N2 e seguimos viagem.

 

Pedrógão Grande: terra de caiaques e pedras

 

Chegámos a considerar fazer um desvio para a praia fluvial do Troviscal, mas achámos que não valia a pena - acabámos por escolher a barragem de Pedrógão Grande. Boa escolha. Logo à chegada fomos presenteados com a visão que faz palpitar o coração de um de nós - caiaques!

Barragem de Pedrógão

A chamada era irresistível e nem uma não muito funcional anca/perna foi obstáculo para os 30 minutos de exercício físico que nos permitiram chegar ao outro lado da albufeira e dar uns mergulhos longe das (poucas) pessoas que aproveitavam a barragem. Infelizmente, isso também quis dizer que ficámos longe da proteção da piscina flutuante: um pé batido numa rocha pôs em risco a viagem de caiaque de regresso - que se fez -, obrigou-nos a uma troca forçada de condutor e a uma visita à farmácia mais próxima.

 

Com os mergulhos "em espera" até haver melhorias do pé maltratado, seguimos viagem em direção às Aldeias do Xisto. A estrada que liga Pena, Aigra Velha, Aigra Nova e Comareira à Nacional 2 não é para estômagos desarranjados, e leva algum tempo a ser percorrida, mas vale bem a pena.

 

Em Pena, três ou quatro ruas com as tradicionais casas de pedra, misturadas com outras de construção mais recente, debruçam-se sobre um penhasco que tem, no fundo, uma ribeira com bom aspeto para mergulhos. Num dia de calor como o que estava, não se vê ninguém na rua, e talvez por isso nem nós conseguimos passear mais do que uns minutos. Mesmo assim, desvio acertado.

Pena, uma aldeia de xisto

Atravessamos o Mondego em Penacova quase sem dar por isso, e num instante deixamos para trás o distrito de Coimbra. Sem grandes melhorias, os mergulhos continuam afastados da ideia e decidimos "papar" quilómetros para nos aproximar o mais possível da cidade de Viseu. Damos uma voltinha por Santa Comba Dão e Tondela, antes de chegarmos novamente à hora da decisão: onde dormir hoje? A escolha é Nelas, a que chegamos saindo ligeiramente da "nossa" estrada.

 

Dia 3 - de Viseu a Trás-os-Montes

 

As horas de estrada começam a fazer-se sentir e uma boa noite de sono é recuperadora. De manhã (relativamente) cedo, seguimos viagem em direção a Viseu, onde aproveitamos para visitar o Parque do Fontelo, onde treina o Clube Académico da cidade. Mais uma vez, como a sorte protege os audazes, chegamos mesmo à hora do treino - é Manuel Cajuda que está ali rodeado de jogadores, num campo secundário.

 

À saída da cidade nota-se que a paisagem não é a mesma que encontrámos no dia anterior. Mesmo os troços ardidos têm uma aura diferente dos mais a sul e as casas por onde passamos gritam "Beira Alta". É um passeio bonito, e diferente, em direção à primeira paragem do dia: a praia fluvial da Folgosa.

Praia fluvial da Folgosa

Chegamos ainda antes da hora de almoço e não há muita gente: algumas famílias estenderam toalhas na sombra, mas o barulho é quase mínimo e a água está pouco concorrida. Entramos à confiança, meio aos tropeções porque as pedras no fundo não são amigáveis. À nossa volta, uma mão-cheia de peixes mordisca-nos pés e pernas. A água é a mais fria que apanhamos na nossa viagem, mas também a mais límpida e serena. Podíamos ficar ali horas - mas vamos seguir viagem.

 

Paramos em Lamego para almoçar e dar uma volta pela cidade. Curiosamente, só à segunda passagem pelo Parque Memorial da cidade damos pelo enorme santuário que lhe faz sombra: o Santuário de Nossa Senhora dos Remédios. Inspirado no Bom Jesus do Monte, em Braga, desafia-nos a uma subida, mas o calor que se faz sentir é mais forte. Ficamo-nos pela contemplação à distância.

 

O caminho até Peso da Régua é sinuoso e ladeado de vinhas, com o Douro a espreitar de vez ao quando lá ao longe. Pela primeira vez nestes dias, apanhamos uns minutos de trânsito - para atravessar a ponte - que rapidamente são ultrapassados. Decidimos seguir viagem com a Barragem de Sordo em mente e, mais engano menos engano (não pensem que seguir a N2 é só ir sempre em frente), lá chegamos ao nosso último mergulho.

Vinhas no Douro

Os comentários que tínhamos lido diziam que a água era límpida e quente. Conhecendo a zona, e a resiliência dos transmontanos, tinha as minhas dúvidas sobre a parte do quente - mas a verdade é que não há outra forma de descrever a temperatura da água. Quem estava dentro de água comentava isso mesmo, e mantinha um ar de quem está na esplanada. Ótima escolha para quem está perto (mesmo que o piso da estrada até lá não esteja propriamente bom).

 

O final do caminho

 

Foi também na barragem que decidimos que seria boa ideia passar já a noite em Chaves (ou perto) para poder descansar mais do que tínhamos feito até aí. Depois do jogo só íamos ter 24 horas para voltar a casa, e convinha ir de olhos abertos.

Barragem de Sordo

Assim, a passagem por Vila Real foi em versão express e a principal preocupação começou a ser arranjar dormida no destino final. Sabíamos, pelas pesquisas que fizemos logo quando a ideia da viagem se formava, que os hotéis na cidade estavam praticamente esgotados, pelo menos para reservas online. A nossa esperança eram as tradicionais pensões e residenciais que encontraríamos pelo caminho.

 

Com a aproximação a Chaves começámos a reparar em nomes, fazer paragens e chamadas. Nega atrás de nega. Decidimos ir andando e demos connosco no estádio do Desportivo de Chaves, onde aproveitámos para comprar os bilhetes para a partida do dia seguinte e, na loja do clube, juntar mais uma camisola à coleção. Sem nada a perder, aproveitámos para explicar a nossa situação e perguntar às funcionárias presentes se tinham alguma ideia de sítios onde pudéssemos pernoitar.

 

Abençoada decisão que, logo à primeira, nos permitiu reservar o último quarto disponível numa albergaria logo à saída da cidade. "Não se esqueçam de dizer que foram pelas amigas do Chaves, que eu sou vizinha", disse-nos uma delas. O recado foi dado e chegou assim ao fim a nossa viagem.

 

O sábado seria dedicado a tentar combater o calor e ver um pouco da cidade transmontana, antes de seguirmos em direção ao estádio ver o aguardado Chaves-Portimonense - podem ler a experiência aqui.

 

Leia também o nosso top-5 de paragens a fazer na Estrada Nacional 2

Chaves

  

 

 

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