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Odiar Nova Iorque... e aprender muito com isso

New York... Concrete jungle where dreams are made of": a voz da Alicia Keys ressoa muitas vezes na minha cabeça quando penso em Nova Iorque, mas fico-me sempre pela selva de cimento - não fui a NYC para realizar sonhos.

Nós no Central Park

Voltemos atrás: fui eu que exigi incluir a cidade como paragem na minha primeira viagem aos Estados Unidos, enquanto o Rui me tentava convencer a começar por Washington D.C., que seria novidade para os dois. Eu estava convicta - "Não faz sentido nenhum ir aos EUA e não visitar Nova Iorque!" - e nem os apelos de "eu já lá estive e não foi assim tão fixe" me fizeram largar a ideia.

Assim, arranjámos um compromisso. Iríamos a Washington, sim, mas faríamos um desvio de dois dias para visitar a grande maçã (os Yankees iam receber os Red Sox e tudo, não foi assim tão difícil arranjar um pretexto para nos deixar os dois felizes). Não era o ideal - e continuo a achar que o meu desamor talvez se tenha devido em parte à falta de tempo que lá passámos - mas era o possível.

Tínhamos estado apenas um dia completo na capital americana quando nos pusemos a caminho de Nova Iorque, de autocarro (uma viagem de quatro horas e meia), aproveitando o jet lag que nos despertava às cinco da manhã. A pit stop começou logo a dar para o torto ao chegar à estação: o autocarro estava avariado, vai partir, afinal não, pronto, agora é que vai ser. Depois de uma meia hora, foi mesmo - e só parou no Holland Tunnel, que separa Jersey de Manhattan.

Quatro horas de caminho e tínhamos ficado "apeados" (mas sem poder sair do autocarro) no meio da autoestrada, com o nosso destino a míseros quilómetros, do lado de lá do rio. A epopeia envolveu esperar pelo reboque da empresa, que não chegou, e sermos rebocados por um camião da Port Authority - por 15 metros, antes do cabo que nos puxava rebentar. Sem termos ordem de soltura que nos permitisse apanhar um táxi até ao nosso destino, acabámos por esperar cerca de uma hora até sermos transferidos para um novo autocarro.

Contas feitas, demorámos quase sete horas a chegar ao destino - e isso poderia ter-me deixado de pé atrás com a cidade, mas não foi o caso. Nunca estive numa situação tão chata com gente tão bem disposta: em vez de resmungos, ouviam-se cantorias e palhaçadas. O rebentar do cabo do nosso reboque foi recebido com gargalhadas. Claro que ninguém estava contente, mas há coisas mais graves no mundo - haveríamos de chegar.

Os famosos táxis amarelos não nos salvaram

O hotel foi uma nova desilusão, apesar de só percebermos exatamente como no dia seguinte, sem água quente para o banho matinal. O barulho era ensurdecedor, o ar condicionado demoníaco, a porta não fechava e os funcionários pareciam, à falta de melhor termo, mafiosos. Mas também não foi pelo hotel que eu odiei Nova Iorque.

O que me fez não gostar da cidade foi a falta de espaço, que só existe verticalmente; a falta de verde, que em abril nem o Central Park - o único espaço onde me senti verdadeiramente bem -, com as suas árvores despidas, consegue camuflar. O frio, mesmo com tempo de t-shirt, que se fazia sentir.

Em Nova Iorque (ou em Manhattan, vá), falta a arquitetura monumental de Washington mas também, vim a reconhecer depois, os edifícios de aspeto antigo que se encontram em Boston ou Filadélfia e as cores que nos recebem em São Francisco. Faltam os vasos na varanda das cidades do sul e falta a proximidade com o rio - que, mesmo estando ali ao lado, só agora começa a ser integrado na cidade. Mas, sobretudo, falta a possibilidade de olhar em frente e ver horizonte sem ter de subir ao Empire ou ao Top of the Rock.

Nova Iorque é uma cidade que, parece-me, implica esforço para gostar. E quem me conhece sabe que eu sou preguiçosa em tudo - não é por uma cidade que vou mudar. Nova Iorque implica tempo, explorar os cantinhos mais recônditos para encontrar aquilo que poucos descobriram, fazer a pesquisa para saber onde se come bem, forçar o contacto para receber um sorriso.

A vista do Top of The Rock

Já eu sou rapariga para cidades que me recebem de braços abertos, de banco no jardim à minha espera, de um azul do céu visível a cada esquina, de cores que não sabia que existiam, de flores novas. Tudo isso me faltou em Nova Iorque.

Ainda assim, não me arrependo da visita - apesar de ter mesmo desejado estar de regresso a Washington logo na manhã do segundo dia - porque me ensinou a coisa que me fez ser realmente feliz nas viagens: não gostamos todos do mesmo. Afinal, se pensarmos bem, foi por ter odiado Nova Iorque, quando toda a gente me dizia maravilhas da cidade, que acabei por não ligar a todos os que diziam que cruzeiros eram viagens para velhos - e ter alguns dos melhores dias de férias da minha vida.

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